O Livro dos Espíritos | Livro 3 “Leis morais” | Capítulo 12 “Perfeição moral”
As virtudes e os vícios, questões 893 a 899
A questão do mérito e da virtude é recorrente em diversas doutrinas e filosofias, sendo a moralidade humana um tema central na busca pela elevação espiritual. No contexto do Espiritismo, essas questões são abordadas de forma profunda, refletindo sobre o papel do desinteresse, da caridade e da transformação interior. As questões extraídas de O Livro dos Espíritos oferecem uma perspectiva desafiadora sobre como podemos entender a virtude, o mérito e o verdadeiro significado de praticar o bem.
Toda virtude tem seu mérito próprio, pois reflete um progresso no caminho do bem. No entanto, a virtude mais meritória é aquela que envolve o sacrifício do interesse pessoal em prol do bem do próximo, sem qualquer pensamento oculto. A virtude que se assenta na mais desinteressada caridade é vista como a mais sublime. Isto significa que, para que a virtude tenha um valor elevado e nobre, o indivíduo deve ser capaz de atuar sem buscar reconhecimento ou recompensa, apenas pelo amor ao próximo e pelo desejo de contribuir para o bem comum.
Este conceito reflete uma das maiores lições da moral cristã: a verdadeira caridade não é aquela que visa retorno, mas sim a que é praticada com o objetivo de aliviar o sofrimento do outro, com a intenção pura de fazer o bem. Essa forma de caridade desinteressada é, de fato, o caminho para um progresso espiritual.
É importante ressaltar que, em nosso estágio evolutivo atual, nem todos têm a capacidade de agir de forma espontânea e desinteressada. Algumas pessoas fazem o bem sem necessidade de esforço, pois já superaram as dificuldades internas relacionadas aos seus próprios sentimentos egoístas. Essas pessoas, que agem com bondade sem esforço, merecem respeito e admiração, pois já travaram lutas internas no passado e, hoje, as boas ações fluem naturalmente em suas atitudes.
Em contraste, aqueles que ainda lutam contra suas más tendências, e que são desafiados a vencer suas inclinações egoístas, também têm mérito, pois suas ações exigem empenho. No entanto, nos mundos mais adiantados espiritualmente, o sentimento do bem é natural, já que seus habitantes alcançaram um grau de evolução onde a caridade é espontânea.
O interesse pessoal é o maior sinal de imperfeição humana. Muitas vezes, as qualidades morais de um indivíduo, que parecem ser virtudes, são apenas um disfarce, onde seu interesse pessoal é desafiado. Quando a pessoa é confrontada com o desejo de algo material ou egoísta, as verdadeiras intenções ficam expostas.
A tendência a se apegar aos bens materiais é um sinal de inferioridade moral, pois quanto mais alguém se apega ao que é passageiro, menos compreende sua verdadeira natureza espiritual. Em contrapartida, aquele que não tem apego às coisas materiais e age de maneira desinteressada reflete uma visão mais ampla da vida futura, além da vida material.
Embora o desinteresse seja uma virtude, esbanjar os bens e riquezas é prejudicial ao progresso espiritual. Aqueles que, por exemplo, distribuem seus bens sem qualquer critério ou reflexão, acabam dissipando riquezas que poderiam ser usadas de forma mais eficiente para o bem do próximo. Embora esses indivíduos possam ter o mérito do desinteresse, falta-lhes a sabedoria de empregar os recursos de maneira realmente proveitosa. Lembrando que todos os bens materiais são concessões de Deus, os quais deverão ser prestados contas.
Portanto, o mérito do desinteresse está intimamente ligado à capacidade de distinguir e aplicar os recursos da melhor forma, não apenas pela boa intenção, mas com sabedoria, direcionando, com boa vontade, para ações que realmente promovam o bem.
O ponto crucial é a questão da motivação do indivíduo ao fazer o bem. Se, por um lado, não se deve fazer o bem esperando recompensas materiais, por outro lado, o desejo de uma recompensa espiritual, como uma melhora em sua condição futura, não é necessariamente uma atitude egoísta. O homem está naturalmente inclinado a buscar o progresso, e é inevitável que, ao praticar o bem, espere que esse esforço se reflita em sua evolução espiritual. Entretanto, o verdadeiro progresso ocorre quando a pessoa realiza boas ações sem a expectativa de uma recompensa imediata ou calculada. Agir com desinteresse genuíno, sem um pensamento de retorno, é a chave para a evolução moral e espiritual. Contudo, o fato de desejar progredir espiritualmente, ao corrigir os próprios defeitos e superar paixões e vícios não é errado. É preciso buscar a aproximação junto a Deus e pela elevação espiritual é, na verdade, um sinal de virtude e não de egoísmo.
Outro ponto relevante é a importância de buscar conhecimentos científicos, que contribuem para o bem-estar material e social da Humanidade. O desenvolvimento intelectual e científico, embora voltado para o mundo material, também contribui para o progresso espiritual, já que o ser humano precisa entender a realidade ao seu redor e fazer uso das descobertas para auxiliar o próximo. O Espiritismo reconhece que o conhecimento ajuda o espírito a evoluir, pois no plano espiritual, aprender será um processo muito mais rápido.
A questão do uso das riquezas também é abordada com profundidade em O Livro dos Espíritos. Aquele que nasce em meio à fartura, sem ter passado por necessidade ou escassez, é menos culpado, do que aquele que se esforçou para adquirir a riqueza, já que este indivíduo a acumulou através de seu trabalho e esforço pessoal, e, portanto, deve ter maior sensibilidade ao sofrimento alheio. Porém, se utilizarem de modo egoísta as riquezas que lhes foram confiadas, voltando-as apenas para seu prazer pessoal, ambos são reprováveis, contudo o mais repreensível é aquele que, tendo conhecido o sofrimento, não busca aliviar a dor do próximo.
A virtude, no contexto do Espiritismo, é associada a um progresso constante em direção ao desinteresse genuíno e à caridade desinteressada. Embora a motivação espiritual seja natural e importante, o verdadeiro mérito está no ato de fazer o bem sem expectativa de retorno, e com a verdadeira intenção de aliviar o sofrimento e promover o bem ao próximo.
O ser humano, à medida que evolui, deve aprender a agir com sabedoria, discernimento e, acima de tudo, com amor incondicional ao próximo. A evolução espiritual só é possível quando as ações não são mais motivadas pelo egoísmo, mas pela busca genuína de um bem maior para todos.
Equipe Vida e Espiritismo
Bibliografia: KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 1 ed. França.Esta é uma livre interpretação.